15/07/2012

IDEÁRIO DE COIMBRA - 25 (conclusão) - Coimbra, sábado, 26 de Junho de 2010



Finitos embora, toca-nos por vezes a graça,
nem tudo que corre nem sempre não pára,
escuta e olha e vê.
Lares se fazem, contrafazem, desfazem
e refazem em outros, mescladas em
outras as pessoas mesmas.
Sempre lograram contemporã existência,
que essência não, a sarjeta com o casino,
a casca de batata com a filigrana.
Por mim, mais sempre cifro que a decifrar
dou, que me até por vezes sucede
saber do que, e a quem,
falo.

*

É uma questão de sobrevivência, versejar. Um gajo mete-se a isto na púbere roupagem – e quando dá conta de si e do que em que se meteu, está tramado: sem poder viver disto, para isto vive. Isto significa: um achado silábico, um jur’assino futuro, um tilintar de cores, uma cegueira com GPS. Não poderia não podê-lo, versejar. Agora já não. Parece que estou daqui a ver o Antero no peitoril da janela, como o memorou Gonçalves Crespo, o Pessoa a almoçar no Restaurante Pessoa, mediante empréstimo de J(oão) C(orreia) de O(liveira), o Vergílio a fumar cigarros para-sempre-até-ao-fim, a besta do Pina Manique a encarcerar gente como se fosse, o Pina, um clone analéptico do McCarthy do zamericanos. Sim, é sobreviver, isto. Não direi, disto, que é apenas isto, nem tudo isto. Sim, no fundo como à flor disto – isto é indiferente. Mesmo a tragédia vertiginosa-lenta de Scott Fitzgerald, de Poe, de Pessoa, de Lowry, de Gomes Leal, de Céline, de tantos ante quem o futuro (agora-isto) só pode indiferenciar nada de coisa alguma. Tenho a minha Mãe doente de tempo. Coração, sangue, sinapses, rins, olhos – pretextos-janelas para o Tempo entrar devastadoramente naquela casa-corpo que me deu nascimento mercê jaculatório amor de um homem hoje morto, ontem mortos, morto há dezasseis anos, dois meses e dois dias. Adiante e siga: finitos embora, toca-nos por vezes a graça, a pulcra graça pueril da Beleza, a uns por coplas, a outros por cópulas: a tudo e todos assiste o direito de algum-pão-algum-circo-algum-poeta-Juvenal-e-juvenil. Sim, Juvenal se chamava, também, um jogador da CUF das minhas primícias lúdicas. E então? Que mal nenhum pode tal (Juvenal) trazer isto à humanidade? Vo-lo recito, de Pessoa, que ’ind’oje à tarde o li – parece que do ano primo de meu Pai, 1917 – isto:

O meu espírito vive constantemente no estudo e no escrúpulo de deixar, quando eu despir a veste que me liga a este mundo, uma obra que sirva o progresso e o bem da Humanidade.

Quatro minutos para as zero. Fatigada doçura nos olhos, óculos incluídos. Ferve a caneta já um pouco. Como terá suportado Macau Pessanha tantos anos? E Pessoa, o viver? Três minutos para as. Dois minutos para. Um minuto. Zero.

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Canzoada Assaltante