13/10/2010

IDEÁRIO DE COIMBRA - podografias de retorno – 37



37. A VIDA JÁ NÃO É CEDO

Coimbra, sábado, 10 de Julho de 2010


Por mais que todos os dias, anos a fio, acordes e te levantes às seis da manhã, a altura chega em que, no chuveiro, te apercebes de que a vida já não é cedo.
Anos a fio – no fio da navalha.
Esta atenção sideral e siderada – ela exerce-te. E a solidão é a via crucial – aceita-a. E azeita-a.
Sabes que é impossível desamar o mar. Ante ele, és atlântico finalmente, como inicialmente amniótico. Isto significa isto – clarificação. Clarifica-te. Ama-te um nadinha mais. Quando, por exemplo, falas de mulheres, não é de mulheres que falas mas de geometria. Sabes muito bem isso. Geometria e paleta de cores. Paleta de cores e reentrância. É reentrar na Mãe, como sabes, agora que te a vida já não é cedo. E um ombro é uma alegria. E a tristeza bebedora dos sábados à noite desde manhã? Tu agora tens a palavra, tu agora é-la toda, ela toda, todo palavras és. No chuveiro, lavando o corpo que tens de ser, sabendo que não é cedo já. Honra. Amizade e honra. Seriedade. Infância & pessegueiro. Cães familiares, de olhos limpos como linhos de altar. Rosas profusas. Infusos lábios. Isenção? De nada serás isento. As tuas glândulas trabalham já a avaria terminal. Uma noite no campo: a laranjeira que, ante a casita, aumenta o clarão da cal. Tanta beleza. Olha, faz parte dela. Sê da beleza. Sê tanto.

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Canzoada Assaltante