17/08/2010

IDEÁRIO DE COIMBRA - podografias de retorno – 15 - fragmento 5




De vez em quando, topo uma palmeira e seu ar triste de árvore exilada (Eça, de cor). De quando em vez, coo aspectos tumulares: vivendas encerradas. Titubeiam mentes avariadas pelos jardins. Crocitam patinhando níqueis os arrumadores. Tossem nas farmácias pulmões amestrados a borato. Cismam e cisnam a negro as viúvas agarradas como lapas à Igreja de S. José. Rondo as ruínas, quais fracturas expostas, da Residencial Larbelo, onde o Tó L.S. teve quarto nos idos de 70/XX e onde o vi com um livro de banda desenhada com as aventuras do polícia de fronteira Jim Canadá. Pugno por ir devagar – para chegar jamais. Cato muito os corpúsculos miniaturais do olvido que resiste à voragem dos anos: a Casa do Fotógrafo na Mesura, o filho do Rui P.M. afogado num tanque da Escola Agrícola, a caneca de vinho do ti’ Henrique Cuco no Marco dos Pereiros, metade exacta da minha vida por bandas de S. Martinho do Bispo/Fala, essa exacta metade chamar-se Teresa, uma noite sentado na amurada do Mosteiro de Santa-Clara-a-Nova com um amigo de que entretanto me desavim: de um olvido apesar de tudo não esquecido nem rendido – perdido apenas.
Estamos vivos, vamos ser soro. Despertamos do sono da cortiça uma garrafa de vinho, celebramos a mansidão agra da nossa contemporaneidade. Somos, sim somo-lo, contemporâneos deste chão de mortos, daí que chã nos resulte a vida. Conhecemos aquele que abriu uma pequena sapataria para a mulher ter com que se entreter, só que depois desataram a florescer, como metástases, os antros hipershoppings, a sapataria rende menos do que obriga, ela olha de lado para o homem, faz-lhe sopa e lava-lhe as cuecas mas não lhe dá ginástica de tálamo nem um beijo de cuspo d’açúcar ao deitar. Como antes da sapataria tiv-fiz-eram uma filha, agora têm de s’aguentar. Sabemos que isto se chama Felicidade, sabemo-lo tão bem.
Acabou-se-me quanta manhã tinha. Faltam sete para as duas da tarde. A minha sopa, faço-a eu, algures na Cidade, em prédio algures.

Sem comentários:

Canzoada Assaltante