28/02/2009

O Novo Dia

© Joel Meyerowitz
Morning Mist
Tuscany, 2002




Souto, Casa, manhã de 28 de Fevereiro de 2009

O novo dia parece-me uma praia atirada de repente ao ar.
No novo dia é que posso ser antigo, parece-me tanto isso.
Ali as árvores instituindo estandartes, ali os cães humanizando
os caminhos, além as mulheres-da-erva humanizando as vacas,
mais além a minha vida afixada às janelas como escritos
de arrendamento para jovens casais empregados na região.

Por sobre uma mesa recordada, duas canecas de esquecido café,
meia-dúzia de lápis apontando os cosmos possíveis, um cinzeiro,
o retrato de uma ida ao pinhal litoral a comer pimentos e laranjas,
ao fundo o mar de repente antigo como um dia muito novo,
a suposição de isto ser assim-mesmo-assim nas outras vidas
entretanto antigas de repente como o mar e o retrato a lápis.

A boca no novo dia sabe a café e a perdão, à costa da sala dão
os despojos de antigas piratarias, sobre a varanda dá-se um fulgor
de iminentes caravelas, vai-se a ver e são só camiões com areia, mas
não faz mal porque a manhã é antiga e cada um de nós é de novo.
Golpes de água ensinam a exposição e o recolhimento, um fruto
parece-me uma jóia de catálogo no negócio do novo dia antigo.

Quando era menino, acontecia-me o futuro deste novo dia, eu
parava de levitar e sucedia-me a evidência do antiguecer, breve,
além agora aquém, nunca a vida se me fez tão tarde como quando
era menino, se hoje penso nisso é porque finalmente posso
indicar na rua (conheço a região, os negócios) casas para arrendar
a antigos casais desempregados como marinheiros de mar algum.

Isto não tem mal, é apenas assim-mesmo-assim, na volta do lar
as esquinas afiadas como lápis possíveis, recordações ulteriores
convocando meninos que bebem café e pedem perdão não
sabem do quê ainda, nisto os piratas irrompem pelos cortinados
das árvores e atiram durindanas de areia e frutos-jóias e retratos
recordados que, de tão antigos, me parecem tanto o mar de repente.


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